Afirmação genérica de que o tema tem repercussão geral não basta para o Supremo Tribunal Federal o examinar. Com essa fundamentação, o presidente da corte, ministro Luís Roberto Barroso, negou agravo em recurso extraordinário interposto por suposta vítima de concussão. Com o trânsito em julgado da decisão, tornou-se também definitiva a absolvição da ex-presidente da Subseção de Osasco (SP) da Ordem dos Advogados do Brasil e de seu ex-marido, acusados do crime.
“Verifica-se a deficiência na fundamentação da repercussão geral. Não basta a simples afirmação genérica de que o tema tem repercussão geral. No caso, a parte recorrente não demonstrou a existência de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os interesses subjetivos da causa”, frisou Barroso.
Na condição de assistente da acusação, o agravante foi Elissandro Márcio Silva Lindoso, ex-presidente da Câmara de Osasco.
Perante o Superior Tribunal de Justiça, o assistente da acusação também havia sofrido revés ao ter negado, em sede agravo, o seguimento de recurso especial.
De acordo com o ministro relator Messod Azulay Neto, nos termos do artigo 932, inciso III, do Código de Processo Civil, o agravante deixou de apresentar “impugnação adequada” aos fundamentos de ausência de preenchimento de requisitos legais empregados pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região para barrar o trânsito recursal.
Defendida pelos advogados Anderson Alexandrino Campos e Roberto Tardelli, cuja tese sustentada foi a de que sequer houve concussão, Libânia Aparecida da Silva chegou a ser presa em flagrante, sendo solta três dias depois graças a um habeas corpus.
Após quase sete anos, ela festejou o esgotamento dos recursos, no último dia 12, destacando que o próprio Ministério Público Federal pediu a sua absolvição.
“Hoje me sinto honrada por Deus, pelo universo e pelo tribunal. Eu sempre pedi justiça”, disse a ex-presidente da OAB.
Flagrante preparado
Consta da denúncia que a acusada e o ex-marido exigiram R$ 13 mil e dois cargos públicos comissionados da vítima, que na época presidia a Câmara Municipal de Osasco. Por meio do outro denunciado, Libânia teria feito a exigência indevida para omitir a prática de atos de ofício, consistentes no dever de revelar, na condição de presidente da subseção da OAB, informações que poderiam prejudicar o chefe do Legislativo. Para o pagamento, os três combinaram encontro em um restaurante no dia seguinte.
A prisão dos acusados ocorreu no restaurante, situado no km 53 da Rodovia Castelo Branco, no dia 24 de outubro de 2017. Alertados pela suposta vítima, policiais civis já estavam de prontidão no local, bem como uma equipe de reportagem de TV, que registrou o momento da abordagem dos agentes aos denunciados. Um envelope com R$ 2 mil foi encontrado na bolsa da então presidente da Ordem e o chefe do Legislativo disse que havia entregue o dinheiro em razão da “extorsão” que sofreu do casal.
Libânia e o ex-marido sempre negaram os fatos
Ela explicou que a conta do restaurante já havia sido pedida, quando ela se dirigiu ao banheiro, deixando a sua bolsa sobre a mesa. Nesse mesmo momento, ainda segundo a mulher, o seu ex-marido conversava com um homem na parte externa do estabelecimento. Após a instrução processual, que tramitou pela 2ª Vara Federal de Osasco, o procurador da República Douglas Guilherme Fernandes requereu em suas alegações finais a absolvição dos réus.
“É no mínimo estranho pensar que o presidente da câmara dos vereadores de Osasco procurou auxílio policial em São Roque, sendo que os fatos criminosos tiveram lugar em Osasco e que o derradeiro encontro se deu na cidade de Araçariguama”, observou o membro do MPF.
Para ele, é capaz que tudo não passe de “crime de ensaio ou flagrante preparado”, porque, se houve concussão, ela se consumou ao se exigir a vantagem indevida, pois o crime é formal e a entrega posterior do dinheiro seria mero exaurimento.
Fernandes também citou que a “celeuma” envolvendo acusados e vítima gravita em torno de “disputas eminentemente políticas”. Segundo o procurador da República, há indícios de suposta pretensão do chefe do Legislativo em “preparar o terreno” para descredibilizar a presidente da OAB perante a opinião pública, evitando que ela fizesse novas denúncias contra a sua gestão à frente da Câmara. Diante desse “verdadeiro estado de dúvida”, ele requereu a absolvição dos réus por insuficiência de prova.
A juíza federal Adriana Freisleben de Zanetti decidiu conforme a manifestação do MPF.
“Destaque-se que os fatos narrados na denúncia possuem inegável pano de fundo político, com todos os entraves e disputas que lhe é peculiar, inclusive com repercussão midiática. Há verdadeira fumaça de incerteza a encobrir a verdade real”, assinalou a julgadora, ao absolver com base no artigo 386, inciso VII, de Código de Processo Penal. Como assistente da acusação, a vítima recorreu e o TRF-3 negou a apelação.(matéria publicada no Conjur)