* Lucas Alves de Camargo
Os acontecimentos recentes com relação ao caso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva colocaram mais combustível na fogueira da polarização eleitoral, as últimas pesquisas confirmam esse cenário. Preferidos por mais de dois terços dos eleitores, Lula e Bolsonaro dividem os corações e as mentes de grande parte da população, mas carregam com a mesma proporção a forte rejeição do grupo opositor.
Esse cenário leva o país para uma polarização política extrema, na qual os líderes superam a figura de representantes políticos para ocuparem a posição de líderes absolutos, aclamados pela força do messianismo, que é elemento formador da nossa cultura política. Percebidos enquanto líderes messiânicos, os representantes políticos são investidos de autoridade moral inquestionável, na qual se deposita a redenção para todos os problemas e males existentes no difícil cotidiano do povo brasileiro.
Para enganar e manipular os grupos de eleitores, a ideologia propagada é minunciosamente estudada para causar a sensação de que apenas aquele representante tem o poder de defender as perspectivas do seu grupo, e que seu projeto é o único possível para assegurar a família, o trabalho, a fé e os valores. Na máxima desse discurso, torna-se o líder messiânico um próprio representante de Deus. O grupo rival é feito de alvo, responsabilizado por todos os males do país e até mesmo pelas deficiências do governo. As inúmeras teorias da conspiração e fake news contribuem para a ampliação do medo e da sensação de insegurança, aspectos que reforçam ainda mais o extremismo e o radicalismo das duas posições.
A polarização extremada também inviabiliza o livre debate de ideias, que de acordo com Jurgen Habermas deveria ser o princípio formador de toda a ação política. Portanto, a sociedade torna-se incapaz de dialogar e deliberar de forma racional sobre os seus verdadeiros problemas, pois fica “cega” pela ideologia propagada pelos seus líderes, incapaz de discernir e admitir os erros cometidos por estes.
Para a infelicidade do nosso futuro, todos os outros projetos e possibilidades se esvaziam diante da sociedade, bestializada pela polarização. Assim, o falso debate ideológico contamina qualquer saída racional para os problemas que vivemos. Aos poucos até mesmo as instituições são combatidas e acusadas de pertencerem a um grupo ou outro, e o resultado: cresce sobre um mal-estar geral a convicção de que apenas uma saída autoritária colocaria fim a tamanha crise, e por fim, a própria democracia é colocada em risco.
O resultado é que a condução do país deixa de se pautar na necessidade e no bem-estar da população (no presente e futuro), para priorizar o projeto de poder de um determinado grupo. Nesse sentido, a história nos apresenta um roteiro bastante comum: para acalmar as possíveis inquietações do povo são distribuídas migalhas, que satisfazem o ego e causam a sensação de que no poder há um pai zeloso, que cuida bem dos seus seguidores.
A saída é a compreensão de muitos sobre a artificialidade da polarização, ou seja, de que ela é incentivada e propagada para ampliar o poder de alguns sobre muitos. Para superar o radicalismo, deveríamos nos preocupar com a participação da sociedade nos processos decisórios, possibilitando a formação de uma nova prática cidadã, que acredita menos nas figuras políticas e mais em projetos construídos para melhorar a vida da população.
* Lucas Alves de Camargo possui bacharelado e licenciatura em “História”, lato sensu em “História, Sociedade e Cultura”, mestrado em “História Social”, titulações conferidas pela PUC-SP; especialização em Gestão Pública pela UNIFESP e licenciatura em Pedagogia pela UNINOVE. Pesquisou a formação do movimento de Direitos Humanos da cidade de Osasco, entre os anos de 1977-1985.